Aqui no Brasil, a pessoa com deficiência, sob o olhar do direito e da cidadania, é uma invenção moderna. Um marco importante foi 1981, Ano Internacional das Pessoas com Deficiência. A partir de um movimento filosófico organizado, a transformação vem se estabelecendo.
Passamos pela Integração, onde a sociedade aceitou conviver nas ruas e espaços públicos com as pessoas com deficiência. Avançando, surgiram práticas baseadas no conceito da Inclusão, onde se reconhece a necessidade de ajustes arquitetônicos, culturais e tecnológicos. Além disso, os conceitos de vida independente e empoderamento tornaram-se mais fortes (autonomia nas tomadas de decisão e na condução da própria vida). Temos a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, documento importante e completo construído na ONU a muitas mãos, que entrou em vigência no Brasil em 2008, como Emenda Constitucional. Outras Leis como BPC/LOAS estão sendo revistas, em especial ao aumento dos albergues e residências inclusivas, hoje em quantidade tímida e pouco proporcional.
A Lei de Cotas (reserva de vagas no mercado de trabalho para pessoas com deficiência) e programas inclusivos de capacitação são realidades que, apesar de aquém da ocupação, produz impacto positivo na imagem do sujeito como cidadão de direitos. Regras de aposentadoria específicas já estão sendo aplicadas. A habilitação e a reabilitação, mola mestra da autonomia e saúde, possuem uma rede desarticulada, apoiada no SUS, salvo os exemplos da Rede Lucy Montoro em São Paulo e a rede Sara Kubitschek, entre outras iniciativas pontuais. A educação tem contado com alguns investimentos do MEC na compra de produtos assistivos, no entanto, isso não significa que todo usuário tenha o equipamento disponível. No ambiente escolar, faltam dois atores: o cuidador e o profissional que adapte os conteúdos e que domine a tecnologia para oferecer o material corretamente para resultados efetivos.O processo de inclusão escolar acabou, equivocadamente, estabelecendo a concorrência entre a rede convencional e as instituições especializadas. Contudo, tivemos uma evolução significativa, mas creio estarmos num momento estratégico importantíssimo. É hora de reconhecermos erros continuados e promovermos uma inovação: mudando o formato de financiamento da inclusão, misturando as redes de ensino convencional com as instituições especializadas que deveriam estar presentes com toda sua experiência e conhecimento, dentro da sala de aula. Fortalecer o SUS e “carimbar” recursos para reabilitação, promovendo assim uma grande capacitação dos profissionais envolvidos nos processos na saúde, educação e assistência.
O caminho da inclusão e da vida independente estão corretos, o desafio é tornar realidade a oferta de serviços e atendimento de forma equânime. E, para, isso precisamos de mão forte e gente trabalhando no sentido certo. Não podemos esmorecer.
Marco Pellegrini, tetraplégico, foi secretario-adjunto da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo.