Senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB) em seu escritório, em Pinheiros.

Um político como poucos

Líder do Governo no Senado Federal, o senador Aloysio Nunes Ferreira atendeu a equipe do A Cidade de S. Paulo em seu escritório, em Pinheiros. O recado para sua missão neste período não podia ser mais claro: “o que espero é deixar o País mais organizado, crescendo, absorvendo o desemprego e dando um pouco mais de esperança às pessoas”.

Não seria preciso mais que os dedos de duas mãos para contar os políticos brasileiros que tem na carga o currículo deste paulista, nascido no interior do Estado. Advogado e cientista social formado pela Universidade de São Paulo, foi ativista estudantil em uma época em que pensar em liberdade rendia a muitos as grades do DOI-CODI. Expulso do Brasil, em exílio, fez Economia Política e mestrado em Ciência Política pela Universidade de Paris, assumindo depois a cadeira de professor de Língua Portuguesa naquela universidade.

Mas seus principais feitos não se deram na área acadêmica. Aloysio Nunes Ferreira, hoje Senador da República, líder do Governo no Congresso, já passou por muitos cargos públicos. Foi deputado estadual e federal, vice-governador do Estado de São Paulo, Ministro Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Ministro da Justiça.

Passou pelo governo Serra na Prefeitura e no governo do Estado. E hoje, dono de mais de 11 milhões de votos, está na liderança de um governo de transição, em um país que assiste, pela segunda vez na sua história, o impeachment de um presidente da República.

A Cidade de S. Paulo: Senador, esse foi um ano de revoluções politicas. Esse é o segundo Impeachment que o Brasil passa. O senhor acha que isso reforça ou enfraquece a democracia?

Eu acho que é um teste para a solidez da democracia brasileira. Mesmo porque de um lado, esse impeachment resultou da atuação de instituições que agiram com plena autonomia e independência para a apuração de erros e crimes administrativos, como o Tribunal de Contas, o Ministério e a Justiça Federal e de outro lado um extraordinário movimento da opinião pública que, diferentemente do impeachment de Fernando Collor, este foi um movimento espontâneo e que não obedeceu nenhuma liderança política, nenhum partido político, nenhuma corporação, mas foi uma manifestação de cidadãos dizendo olha “eu quero um Brasil diferente”. Ao mesmo tempo que mostra as instituições democráticas funcionando, mostrou também um vigor novo da cidadania.

ACDSP: Mas o senhor não acha uma contrassenso democrático – o cidadão muitas vezes não vota com consciência mas se movimenta dessa maneira para sair às ruas na hora de dizer o que não quer?

Não foi um não à Dilma, não ao PT. Mas um não à corrupção e também um sim a favor de práticas políticas novas e de uma maior fidelidade do eleito com os compromissos com o seu eleitorado. A uma vida pública mais limpa. Serviços públicos mais eficientes. As manifestações de 2013, por exemplo, tiveram esse objetivo: não foi apenas contra alguns centavos a mais na passagem do transporte público mas a exigência de serviços públicos que correspondam com o imposto que o cidadão paga. Ou seja, foi a favor de muita coisa também. Agora, eu penso que isso será um grau de consciência maior dos eleitores. Poucos vão votar simplesmente por causa de um carimbo, de uma sigla partidária. Os eleitores vão querer saber qual a conversa do candidato para cada um deles. E é uma conversa que vai ser favorecida com as novas regras de financiamento de campanha. Não teremos mais as super produções o que vai valer será a conversa pela internet e nas reuniões. Que o candidato se exponha e que se mostre capaz de ouvir.

ACDSP: Mas essa personificação não acaba enfraquecendo os partidos políticos, uma vez que o sistema democrático brasileiro se dá por meio dos partidos que defendem ideias? Fortalecer as ideias não é parte do parlamentarismo, que aliás, é uma bandeira do PSDB?

Os partidos vão ter de mudar porque não dá para mudar o povo. Não é bom mudar o povo. Os partidos vão ter de mudar para se adequar com o novo estado de evolução da opinião pública. Nós temos que trabalhar e estamos trabalhando para isso. Nós temos no Senado duas Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) visando a coibir essa multiplicação de partidos, com mecanismo que é a proibição de coligação nas eleições proporcionais, e o condicionamento ao acesso ao fundo partidário e ao tempo de antena por um mínimo de desempenho eleitoral. Não tem sentido você pensar que funciona uma democracia em que a opinião pública se oriente por partidos quando nós temos representados hoje na Câmara dos Deputados, 26 partidos. Eu penso que para esse processo de impeachment não seja desperdiçado, nós temos que aprovar essas duas PECs e daí caminhar para uma outra forma de eleição que eu acho mais evoluída que a nossa que é o voto distrital.

ACDSP: E essa era a pergunta que eu ia chegar porque nós temos esse jornal que é regional e que trata de temas regionais. Nesse bojo, o voto distrital faz com que o político possa representar um grupo de pessoas mais de perto…

Melhor representar um grupo de pessoas, as pessoas vão saber em que votaram, quem foi eleito tenderá a se lembrar mais dos seus eleitores. Isso levará seguramente a uma nova forma de organização dos partidos – levará os partidos a se enraizarem nas comunidades. Eu penso que esse seria o objetivo a ser alcançado. Eu apresentei um projeto de lei três anos atrás para instituir o voto distrital para eleição de vereadores para cidades com mais de 200 mil eleitores, ou seja, nas cidade onde há segundo turno. Infelizmente, esse projeto não foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça, foi considerado inconstitucional. Mais tarde, o Serra apresentou um projeto igual que foi aprovado na CCJ mas não foi a Plenário ainda. Isso mudaria a relação da Câmara Municipal com a cidade. São Paulo por exemplo, tem 55 vereadores e 8, quase 9 milhões de eleitores. O candidato tem de buscar voto em todos os cantos da cidade. Mas alguns vereadores conseguem uma inserção local, alguns vereadores que já começaram a ter um perfil distrital. Ou seja você criar distritos eleitorais em que os partidos lancem candidatos e que se elejam aqueles mais votados daquele distrito.

ACDSP: Mas você não acaba transformando os bairros em currais eleitorais? Uma troca político-assistencialista?

Essa troca assistencialista poderá continuar a existir, e é uma forma de representação. Mas mesmo um vereador que se elege nessa base de relações pessoais ou personalíssimas acaba tendo de tomar posição como temas mais abrangentes como por exemplo o zoneamento e isso repercute no bairro dele. Se ele toma uma posição ou outra ele vai ter de se explicar no seu bairro. O voto distrital permite que você tenha vereadores locais e vereadores que sendo locais possam tratar de temas globais. Eu vou te dar um exemplo na história politica mundial: Winston Churchill que se elegeu durante 65 anos no mesmo distrito e derrotou o Hitler na segunda guerra mundial.

ACDSP: O que o senhor espera desse governo Temer, um governo PMDB?

Não é um governo PMDB. Esse é um governo de coalisão que se formou num processo de impeachment onde você tem convivendo a antiga oposição com setores da antiga situação e que estão empenhados num programa de salvação nacional, programa de emergência, basicamente centrado na questão fiscal. O rombo é grande, mas você tem hoje no centro da atividade da politica econômica do governo a busca do equilíbrio fiscal, que era considerado durante muito tempo, a partir da metade do segundo mandato do governo Lula algo da direita, ou rudimentar como diria Dilma. O resultado foi isso: um enorme rombo nas contas públicas que nos levaram para a crise que estamos vivendo.
Eu espero que a gente consiga chegar a 2018 com um País organizado, com menos tensões politicas, com a fixação de alguns programas de governo que possam se estender por vários governos – como saúde, educação, inovação, segurança pública. O método de gestão do dinheiro público também imune a controvérsias – a ideia da responsabilidade fiscal foi uma conquista nossa, do Fernando Henrique Cardoso, tem que ser permanente. Espero uma diminuição profunda, grande, sensível do mercado político em torno dos cargos públicos. Então, é isso que espero: deixar o País mais organizado, mais em ordem, crescendo, absorvendo o desemprego e dando um pouco mais de esperança às pessoas.

  • O Brasil está passando por mudanças profundas e estas mudanças contrariam muitos interesses. Em todos os rankings de competitividade estamos sempre nos últimos lugares. É preciso de gestores com muita coragem para mudar essa situação.