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Palavras para falar de moda

Nosso cronista Leo Coutinho brinca com palavras, cabelos e roupas – de época antiga e recente.

Igual a tudo na vida, palavras entram e saem de moda pelas circunstâncias mais diversas. E surpreendem: “Como pode uma palavra dessas ter entrado nas conversas?”, a turma se pergunta.

E por falar em moda, abro parênteses para os cortes de cabelo. Vendo fotografias do meu avô Montoro lá nos anos 1950, achava ele muito bonito e elegante, mas não entendia aquele penteado rente nas laterais e cheio no alto, puxado para trás com gomalina, que era como chamavam o gel modelador. Nas mesmas fotos a gravata mal alcança a altura do umbigo e o terno é branco. Outras fotos provam que ninguém escapa da moda. Meu avô Coutinho se vestia do mesmo jeito e obviamente só se livrou do penteado porque cabelo ele só tinha nas laterais, nenhum no cocuruto.

Dia desses publiquei as fotos no Facebook e comentei da minha surpresa em ver que a moda voltou com tudo. No mundo inteiro a turma aderiu ao corte – inclusive as meninas. No evento de moda que entrou para a história pelo viés político, a grife Chanel desembarcou em Havana para o seu primeiro desfile na América Latina, simultâneo a um cruzeiro com turistas dos Estados Unidos. E como se apresentou a marca aos cubanos e ao mundo? Com o mesmo estilo do vovô Romeu lá nos anos dourados, tanto no corte do terno e da gravata quanto do cabelo. Fecha parênteses.

Voltando à palavras, entraram na moda recentemente as mais improváveis. Para ficar em três exemplos cito procrastinar, acrônimo e mesóclises. Poderia trazer outros, mas evitá-los-ei primeiro para não cansar esta freguesia e, principalmente, para ir logo ao que mais importa em moda, que é a tendência.

Do mesmo jeito que chegam as palavras se vão. Entre as que se despedem enxergo duas: profissão e foco. As novas gerações no mercado de trabalho mal conseguem definir qual seria a sua profissão e estão sempre trocando de trabalho. Não se permitem estar “focados” particularmente em um assunto ou ideia. Buscam sempre uma visão mais ampla, plural, holística (olha aí mais uma palavra improvável que chegou) das coisas. Contextualizam tudo. Como algoritmos vivos, têm muita informação e consideram todas as variáveis possíveis.
Pode parecer um fenômeno novo mas não é. Há quinhentos anos os renascentistas viviam assim. Leonardo, Michelangelo, Rafael e companhia faziam de tudo um pouco: pintura, escultura, projetavam máquinas, estudavam anatomia. Na metade do século passado Artacho Jurado era arquiteto, empresário, construtor, publicitário, escultor. Walther Moreira Salles foi advogado, empresário, banqueiro, diplomata, político, mecenas. Vinicius de Moraes era bacharel em Direito, poeta, diplomata, dramaturgo, compositor, cantor, cronista.

Agora vivemos uma revolução das comunicações que se espalha por toda a sociedade. Vale procrastinar ou aderir ASAP. Vale resistir às mesóclises e ao penteado do vovô. Vale até fazer plano de carreira e tentar passar a vida concentrado num assunto. Mas é inútil. Gostando ou não já somos todos influenciados e cedo ou tarde vamos acabar nos acostumando. Até que outra moda apareça.